Recorrendo a dados obtidos com os espectrógrafos ESPRESSO e HARPS, uma equipa internacional, que inclui os astrofísicos Alexandre Correia, da Faculdade de Ciências e Tecnologia da Universidade de Coimbra (FCTUC) e João Faria, do Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço (IA), detetou o segundo exoplaneta a orbitar o binário de estrelas BEBOP-1 (ou TOI-1338). O resultado foi publicado ontem na revista Nature Astronomy.
O primeiro planeta à volta deste binário, denominado TOI 1338 b ou BEBOP-1b, foi detetado em 2020, com dados de trânsitos, obtidos pelo observatório espacial TESS (NASA). Este exoplaneta, quase com o diâmetro de Saturno, orbita as duas estrelas em 95 dias.
Como os trânsitos planetários só conseguem medir o diâmetro do planeta, o projeto BEBOP (acrónimo de Binaries Escorted By Orbiting Planets, ou Binários Acompanhados por Exoplanetas) procura detetar planetas circumbinários, através da observação de variações nas velocidades radiais das estrelas.
“Este resultado demonstra como o método das velocidades radiais pode ser usado para encontrar exoplanetas que orbitam estrelas binárias, permitindo determinar não só a órbita mas também a massa do planeta”, comenta João Faria (IA e Dep. de Física e Astronomia da Faculdade de Ciências da Universidade do Porto). Sabendo a massa, em conjunto com o diâmetro determinado por trânsitos, permite calcular a densidade e inferir a composição do planeta.
O projeto BEBOP usou o ESPRESSO e o HARPS, ambos instalados em telescópios do Observatório Europeu do Sul (ESO), para tentar observar o BEBOP-1b. Apesar dos seus esforços, a equipa não conseguiu detetar o planeta, no entanto, este aparente fracasso permitiu-lhes estabelecer um limite máximo para a massa deste planeta, a rondar as 22 massas da Terra.
Mas a procura pelo exoplaneta conhecido levou a equipa a descobrir o BEBOP-1c, um planeta com uma massa cerca de quatro vezes maior do que a de Neptuno e com um período orbital de 215 dias. Com dois planetas detetados, este passa a ser apenas o segundo sistema planetário conhecido à volta de um binário de estrelas – um sistema semelhante ao do planeta Tatooine, da “Guerra das Estrelas”.
“Na Universidade de Coimbra estudámos a dinâmica global do sistema. Foi possível demonstrar que o sistema é estável quando as órbitas dos planetas são quase circulares e se encontram aproximadamente no mesmo plano orbital das duas estrelas”, conta Alexandre Correia, investigador do Centro de Física da Universidade de Coimbra (CFisUC) e docente do Departamento de Física da FCTUC.
O primeiro autor do artigo, Matthew Standing, atualmente a trabalhar na The Open University, mas que começou este trabalho na Universidade de Birmingham, comenta: “Este foi um sistema difícil de confirmar e as nossas observações foram interrompidas pela pandemia do COVID, quando os telescópios no Chile encerraram durante 6 meses, durante uma parte crítica da órbita deste planeta. Esta parte da órbita só voltou a ficar observável no ano passado, altura em que finalmente pudemos finalizar a deteção”.
Os planetas formam-se a partir de acreção dos materiais do disco protoplanetário, que envolve as estrelas recém-nascidas. No caso dos sistemas circumbinários, o disco orbita ambas as estrelas, ao mesmo tempo que as estrelas se orbitam mutuamente. A gravidade e o movimento do binário criam uma zona de instabilidade mais próxima das estrelas, e por isso os planetas só se formam mais afastados.
João Faria explica: “A detecção do BEBOP-1c em torno de um sistema binário de estrelas permite-nos estudar as condições em que estes planetas se formam, que são diferentes das que existiram durante a formação do Sistema Solar. A análise de dados trouxe vários desafios devido ao efeito dominante que o sistema binário tem nas velocidades radiais, e que foi preciso modelar antes de encontrar o sinal do planeta”.
Instituto de Astrofísica e Ciências do Espaço
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